sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

AS BOAZINHAS QUE ME PERDOEM...

Qual é o elogio que toda mulher adora receber? Bom, se você está com
tempo, pode-se listar aqui uns 700: mulher adora que verbalizem seus
atributos, sejam eles físicos ou morais. Diga que ela é uma mulher
inteligente e ela irá com a sua cara. Diga que ela tem um ótimo caráter,
além de um corpo que é uma provocação, e ela decorará o seu número. Fale
do seu olhar, da sua pele, do seu sorriso, da sua presença de espírito,
da sua aura de mistério, de como ela tem classe: ela achará você muito
observador e lhe dará uma cópia da chave de casa. Mas não pense que o
jogo está ganho: manter-se no cargo vai depender da sua perspicácia para
encontrar novas qualidades nessa mulher poderosa, absoluta. Diga que ela
cozinha melhor que a sua mãe, que ela tem uma voz que faz você pensar
obscenidades, que ela é um avião no mundo dos negócios. Fale sobre sua
competência, seu senso de oportunidade, seu bom gosto musical. Agora,
quer ver o mundo cair? Diga que ela é muito boazinha.

Descreva aí uma mulher boazinha. Voz fina, roupas pastéis, calçados
rentes ao chão. Aceita encomendas de doces, contribui para a igreja,
cuida dos sobrinhos nos finais de semana. Disponível, serena, previsível,
nunca foi vista negando um favor. Nunca teve um chilique. Nunca colocou
os pés num show de rock. É queridinha. Pequeninha. Educadinha. Enfim,
uma mulher boazinha.

Fomos boazinhas por séculos. Engolíamos tudo e fingíamos não ver nada,
ceguinhas. Vivíamos no nosso mundinho, rodeadas de panelinhas e
nenezinhos. A vida feminina era esse frege: bordados, paredes brancas,
crucifixo em cima da cama, tudo certinho. Passamos um tempão assim,
comportadinhas, enquanto íamos alimentando um desejo incontrolável de
virar a mesa. Quietinhas, mas inquietas.

Até que chegou o dia em que deixamos de ser as coitadinhas. Ninguém mais
fala em namoradinhas do Brasil: somos atrizes, estrelas, profissionais.
Adolescentes não são mais brotinhos: são garotas da geração teen. Ser
chamada de patricinha é ofensa mortal. Pitchulinha é coisa de retardada.
Quem gosta de diminutivos, definha.

Ser boazinha não tem nada a ver com ser generosa. Ser boa é bom, ser
boazinha é péssimo. As boazinhas não têm defeitos. Não têm atitude.
Conformam-se com a coadjuvƒncia. Ph neutro. Ser chamada de boazinha,
mesmo com a melhor das intenções, é o pior dos desaforos.

Mulheres bacanas, complicadas, batalhadoras, persistentes, ciumentas,
apressadas, é isso que somos hoje. Merecemos adjetivos velozes,
produtivos, enigmáticos. As inhas não moram mais aqui. Foram para o
espaço, sozinhas.

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